O covarde

O carro do roteirista Amitabh Roy estraga em uma pequena cidade do interior da Índia. Sem condições de seguir viagem, Bimal Gupta, um rico plantador de chá da região, oferece hospedagem a Roy. Quando chegam em casa, já à noite, Roy se surpreende ao encontrar Karuma, esposa de Bimal, sua paixão dos tempos da faculdade.

O diretor indiano Satyajit Ray tece uma narrativa marcada pelo silêncio entre os apaixonados, que relembram sua paixão através de olhares, gestos, tentativas de diálogos que não se realizam. Flashbacks reconstituem o relacionamento e o motivo da separação, motivada pelo receio – expresso no título do filme – de Roy em assumir um relacionamento mais sério. A narrativa curta, com apenas três personagens em cena, expressa um dos belos versos da música brasileira: “é desconcertante rever o grande amor.”  – Chico Buarque e Tom Jobim. 

O covarde (Kapurush, Índia, 1965), de Satyajit Ray. Com Soumitra Chatterjee (Amitabha Roy), Madhabi Mukherjee (Karuna Gupta), Haradhan Banerjee (Bimal Gupta).

As praias de Agnês

O documentário pode ser visto como uma espécie de testamento fílmico de Agnès Varda. A narrativa começa com a montagem de um cenário em uma das praias frequentadas pela fotógrafa/cineasta na infância. Encenações na praia se fundem a trechos de seus filmes, amparados por uma sensível e sincera narração em primeira pessoa. 

Parte da história do cinema francês, pouco antes e a partir da nouvelle-vague francesa, está registrado em As praias de Agnès. Os relatos e os filmes se imbricam com a vida pessoal de Varda, em momentos de emocionar, como no momento em que ela vê fotos de amigos mortos e, principalmente, ao comentar seu relacionamento com o também cineasta Jacques Demy. A rua onde ela viveu, em Paris, serve como cenário para a simulação de uma praia em plena capital francesa, com areia, sombrinhas, mesas de trabalho como se fosse uma produtora de cinema ao ar livre. Em um trecho, a cineasta tenta definir cinema: “O que é o cinema? É luz que chega de algum lado e que é retida pelas imagens mais ou menos escuras ou coloridas.” Filme a filme, memória a memória, Agnès Varda revela toda a sua paixão por essas imagens escuras ou coloridas e pela vida.  

As praias de Agnès (Le plages D’Agnès, França, 2008), de Agnès Varda.